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"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


domingo, 29 de novembro de 2009

OS ANOS 70 EM QUE VIVI - Por: Glória Pinheiro

O impacto foi decisivo naquele ano de 1970.
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Rio de Janeiro, Bossa Nova, Garota de Ipanema, do Samba do Avião, berço do samba tradicional de Noel Rosa, Pixiguinha, Ataulfo Alves, Cartola, Mário Lago que até inventou uma Amélia que era Mulher de Verdade, do mineiro Ari Barroso que se transportou para lá para compor uma linda canção Aquarela do Brasil, dos inumeráveis boêmios da Lapa e de Vila Izabel... A tão decantada Cidade Maravilhosa das praias do Leme, Copacabana, Ipanema, Leblon... E ainda a sua incomensurável beleza natural com sua topografia imensamente diversificada, com direito a maior floresta urbana do mundo. Sim, o Rio de Janeiro é tudo isso e por isso qual garota que vivesse no Crato nos anos 60, não sonhasse conhecer o Rio de Janeiro?
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Mas São Paulo foi quem me cativou e me encantou desde que aqui cheguei durante o rigoroso inverno daquele ano da Copa do Mundo de 1970. São Paulo com suas belas e organizadas feiras livres chegando até o consumidor. Uma vez por semana acordava de madrugada para escutar o burburinho dos feirantes, o som poderia ser perturbador, mas, para mim, soava como se fosse uma melodia, algo parecido e prazeroso quando escutava o ronco do motor do engenho naquelas madrugadas de outrora. Lá era o prenúncio de um novo dia a começar para as brincadeiras. Agora o sentimento era outro, aquele barulho da feira, significava uma radical mudança de vida, outras perspectivas de uma vida nova com mais possibilidades de enxergar o mundo por outro ângulo e em outra dimensão. Esta sensação me acompanhou durante a fase de adaptação naquele primeiro ano que moramos na pequena e pacada Rua Áurea, nas imediações do Parque do Ibirapuera.
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Muito observadora, no trajeto para a escola, gostava de acompanhar as primeiras escavações da construção do metrô, bem como as implosões de alguns prédios antigos. Pouco me importava a já morosidade no trânsito da cidade devido àquela obra, afinal o metrô de São Paulo estava surgindo com várias décadas de desvantagens em relação ao Metrô de Buenos Aires, construído no início do Século XX. Quando passávamos na Avenida 23 de Maio, achava inacreditável que poucos anos atrás, um rio provavelmente Rio Anhangabaú, fora aterrado para dar passagens aos automóveis. Fui entendendo que a cidade não pára. Quando passávamos pela Avenida Paulista, tinha por hábito contar os casarões dos Barões do Café que ainda restavam. Cheguei a contar aproximadamente 14 casarões que iam desaparecendo pouco a pouco. Ia observando de um lado da avenida com a ampliação sugaram parte dos jardins de algumas residências, incluindo aí o casarão da família Matarazzo que infelizmente foi dos últimos a serem demolidos, pasmem, para transformar aquela relíquia num estacionamento. São Paulo poderia ter se transformado sem dilapidar parte da sua História, especialmente, a Avenida Paulista.
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No segundo ano mudamos para o Alto das Perdizes, (naqueles tempos para se viver bem procurasse o Alto da Lapa, o Alto de Pinheiros, etc.) local privilegiado, boa vista, parte mais alta do bairro, era o único edifício da Rua Monte Alegre, recém construído. Durante os próximos cinco anos presenciei a completa transformação do bairro. Casas e casarões dando lugar aos edifícios que brotavam aos poucos e depois a transformação foi se dando em progressão geométrica. Só não demoliram os suntosos prédios dos Colégios Batista, Santa Marcelina, São Domingos e a magestosa sede da PUC-SP com o seu, um pouco mais moderno, teatro TUCA e algumas raras residências.
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Faltou pouco ou quase nada para eu presenciar a violenta e trágica invasão da PUC pelo Coronel Erasmo Dias, um dos braços direitos da repressão em São Paulo. Lembro daquele corre-corre as bombas e os tiros disparandos, ferindo estudantes, uma delas ficou paraplégica pela invasão daquele homem destrambelhado, impiedoso e sem noção que se fazia crer, à serviço da Pátria?
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Sim, São Paulo do Grito do Ipiranga, do início da industrialização, da Semana de Arte Moderna de 22, dos museus, teatros, cinemas, parques e de tantas Histórias e infindáveis acontecimentos... Cidade querida tu és o palco central de muitos acontecimentos do nosso Brasil. Tens o meu respeito e amor por ti oh minha querida São Paulo!
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Por: Glória Pinheiro

14 comentários:

  1. Maria da Gloria.

    Parabens.

    Voce recorda sem esquecer detalhes do inicio até hoje, os passos dados e o caminho seguido nesta bem sucedida jornada paulistna. Um belo relato.

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  2. Obrigada, Morais, são tantas memórias. Por aqui já vi um pouco de tudo, até irmã de um grande político mendigando um copo de leite na padaria da esquina, quando conseguia escapar de sua enfermeira. O interessante é que na casa ao lado viveram os personagens daquela novela real "Éramos Seis", que mostrava São Paulo nas primeiras décadas do Século XX.
    Um bom domingo

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  3. Maria de Fátima, gostei do seu depoimento e de sua passagem por São Paulo. O Rio de Janeiro é linda demais. Porém, como dizia minha prima que morava em Niterói: "Glória, você sair de São Paulo para sentir medo do Rio?" É que sempre achei o contraste social do Rio mais próximo. Em uma de nossas viagens ao Rio, estávamos querendo conhecer o Garota de Ipanema, fomos alertados pela própria polícia que tivéssemos muito cuidado, pois acabaram de raptar uma criança na praia. No hotel as recomendações foram tantas, que o medo aumentou. Aqui por São Paulo não existem tantas balas perdidas por toda a cidade. As "confusões" ficam mais na periferia.
    Sempre gostei de apreciar a estátua de Borba Gato, um dos Bandeirantes que desbravou a cidade. A Rua Aurea fica no início da Vila Mariana, próxima da Av. Paulista, quase na beirada do Parque do Ipirapuera, próxima do Instituto Biológico, um prédio grande e antigo que em seu quintal, até hoje, cultivam cafés, para não negar a tradição de São Paulo da Garoa rsrsrs.
    Um grande abraço

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  4. Glória, parabéns! você descreveu muito bem a sua experiência em São Paulo. Revelou o amor que tem por essa terra que lhe acolheu. Belo texto.

    Abraços

    Magali

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  5. Magali, em nosso Crato vivi belos anos de minha vida. Mas como não agradecer à São Paulo a acolhida durante a maior parte da minha vida? Logo mais já são 4 décadas em São Paulo! É graditão e amor eternos, assim como tenho pelo Crato, por La Paz Bolívia. Acrescento Fortaleza, Recife e Varzea Alegre a Sede do Blog Sanharol.
    Um grande abraço

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  6. Gloria, Fatima, e Magali.

    É muito bom, bonito e saudavel ouvir voces falarem dessa trajetoria vitoriosa. Sabemos o quanto dificil é fazê-la, por esta razão maiores são os meritos. Muito mais bonito é ver que o cerebro guarda as boas lembranças de suas origens, de suas infancias junto da familia. Voces não escrevem sem falar dos irmãos, dos colegas, das professoras, dos pais, das missas, dos pic nic, em fim de tudo que marcou a vida com alegria e felicidade. Parabens.

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  7. Glória:
    Simpatizo mais com São Paulo do que com o Rio de Janeiro. Acho o povo de São Paulo mais sério, mais trabalhador, mais "centrado", como se diz aqui no Nordeste.
    Se você observar bem o que tem de sério no Brasil de hoje é gestado pela elite paulista.

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  8. Concordo com você, Armando.
    Quem de nós já teve a oportunidade de tomar um taxi em São Paulo e outro na belíssima cidade do Rio de Janeiro?
    Estes profissionais de São Paulo, em sua maioria são nordestinos, podem servir de bons exemplos e darem uma boa lição aos maus profissionais cariocas que gostam de dobrar o preço da corrida de taxi. Isto é frequente, basta perceberem que não moram no Rio. Já presenciei em um restaurante, enganarem turistas argentinos. Preços para brasileiros menores do que para os turistas. Certa vez, nos cobraram na conta de um restaurante uma taxa para a lavagem dos guardanapos. Isto não existe! E por aí vai... Não me considero bairrista, de forma alguma, nem poderia ser, mas por causa dessas e outras venho protelando uma viagem ao Rio.

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  9. Glória,

    Li o texto com atenção. Acredito que vc tem uma veia de memorialista e escreve muito bem com correção e acerto. O tempo vai passando e como dizia o José Paulo Paes, um fabuloso poeta paulista, o passado vai ficando cada vez mais vívido e presente. Admiro São Paulo com sua força fabril, seu corre-corre, seu moto-contínuo. É muito bom passear por aí, prá viver já são outros quinehntos e se tem que ter manual de sobrevivência na selva. O RJ é um barato, a cidade é de ofuscar qualquer um e a beleza e a leveza do local contaminam as pessoas. Se pudesse voava para lá e lá morava, como dizia Julio Cortazar se referindo a Paris: prefiro ser nada numa cidade que é tudo, do que o contrário. Mas, pelo sim pelo não, vamos ficando mesmo por aqui...

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  10. Amiga Maria de Fátima, você tem razão. A violência, infelizmente, se encontra em todo lugar. Embora em alguns locais mais que em outros, proporcionalmente ao número de habitantes... As pesquisas comprovam. Na minha visão pessoal, eu não escolheria o Rio de Janeiro, Recife, Maceió e nem Vitória para viver e até a bela Fortaleza também anda crescendo nos índices de violência. Fora isso o Rio de Janeiro é uma cidade maravilhosa cheia de graça, abençoada por Deus pela natureza com encantos mil.
    No final das contas acredito que em tantos anos vivendo no meio disso tudo, conhecendo bem a cidade, aprendemos a nos defender.
    Agora tem mais: acho lamentável ver um ator como Casaré e como tantas outras pessoas, estarem dormindo em seus lares e morrerem com uma bala perdida.

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  11. José Flávio, entendo perfeitamente sua escolha pelo Rio de Janeiro. Você foi seduzido pela beleza de lá. E por que não, se o Rio é todo aquele encanto? Certa vez presenciei uma cena inesquecível. Uma mulher desceu o morro seguida por seus filhinhos. Todos em fila, foram se aproximando sambando (como só os do morro sabem fazer) numa praça em Ipanema e juntos seguiram a banda de Ipanema. É tudo de bom ir ao Porcão da Urca, depois caminhar pelo calçadão suspirando com toda aquela beleza. Subir pela Tijuca ao Alto da Boa Vista, entrar naquela Floresta é inacreditável que tudo aquilo é urbano.
    Se fosse para escolher pela beleza, eu não teria dúvida. escolheria o Rio de Janeiro. Aliás, daquele lindo estado, cuja topografia (um colírio de Deus) é única em todo o Brasil, a beleza é para todos os lados. Com exceção de Campos, cidade muito parecida com o Crato em costumes, economia, etc., algumas cidades serranas e poucas cidades do Vale do Paraiba, posso lhe dizer que conheço mais de 80% daquele belo estado brasileiro.

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  12. Maria da Gloria.

    O Dr. Jose Flavio se encanta é com Matozinho. Não troca por nenhuma outra. Talvez por Bertioga...

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