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"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

O resto não importa
- Claude Bloc -
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As palavras escorregavam serenas e naturais. Voltei àquela casa e era como se eu a conhecesse há muito tempo - ou como se ela me conhecesse há mais tempo ainda. E nos conhecíamos de fato. Éramos quase um só corpo e matéria. Uma simbiose fundindo-se no tempo. Deve ter sido por isso que deixei que as horas se encostassem à margem do relógio. Fui ficando.  Não podia esquecer o motivo de ter ido lá. Eu, que tanto ansiava por aquele pedaço de tempo estendido ao longo dos anos, acenei para mim mesma e pensei:  vamos!
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Senti-me em casa novamente. Observei os pequenos trejeitos das pessoas me acolhendo, as pequenas imperfeições nas paredes toscas, percebi quase todas as minhas hesitações e o sentido dos olhares amigos e afáveis que velavam minha presença ali. 
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Eu tinha razão: o espaço estava envelhecido e de repente me pareceu demasiadamente abandonado para receber minha música, minha presença que deveria ser tão envolvente quanto a emoção que eu sentia. O chão de taco, a cortina que não abria mais, as letras lá no alto: FrançAlegre, tudo parecia olhar-me com uma grande saudade. Como se eu ou aquela música que íamos ouvir – aquele estilo de vida que hoje eu transportava – fosse uma espécie de profanação de um local onde a vida fora tão exuberante e plena. E eu me postava tão séria, naquele momento. Tão consciente que me doíam as têmporas. Como se o coração pulasse dentro de mim sem trégua e eu deixasse vazar minha emoção por todo o ambiente.
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Encostei-me para trás e pousei as mãos no parapeito, naquela posição de espera tão tipicamente minha, embaralhando os sonhos pela bainha da chapada. Da janela, avistei o alto da serra, altiva em seus tons celestes. O azul se espalhou pelo recinto. Mas tudo já entrava em palco. A cena. O cenário.
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O resto não importa. Voltei!

Claude Bloc

Caros amigos do Blog Sanharol,
Estive ausente  por uns dias porque estava em D. Quintino para os festejos de S. Sebastião e naquele distrito não tive acesso à internet. 
Um abraço a todos
Claude

4 comentários:

  1. Prezada Claude.

    Que belo texto. Rico em argumentos e literatura rara. Perdoe-me a expressão, mas como falamos lá em nós: está pai d'egua. Parabens.

    A. Morais

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  2. Claude,

    Parabéns pelo belo texto e pelo retorno majestoso e triunfante ao ponto. Composição de céu, vida, terra e ar. Mistura pra sonhar.

    Sávio.

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  3. Morais,

    Obrigada pelo jeito especiasl de saudar meu texto. Lá em nós também se fala "paid'égua", portanto a expressão está aceita e é bem vinda...

    Abraço,

    Claude

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  4. Sávio,

    Suas palavras nunca caem no vazio, pois são cheias de sincero apreço.
    Desta forma, todos os elementos te agradecem em meu nome e em nome da poesia.

    Por entre estrelas agradeço tanta gentileza...

    Abraço poético,

    Claude

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