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"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


quarta-feira, 1 de junho de 2011

NUMA CASA DO SERTÃO - Por Mundim do Vale.

Melhor postagem do Mês de maio - Mundim do vale
Nesse verso popular
Eu vou rimar as verdades,
Das coisas de utilidades
Que tem lá no meu lugar.
Se o leitor precisar
De arapuca, alçapão,
Canário e currupião
Eu dou a dica segura.
TUDO QUE A GENTE PROCURA
TEM NAS CASAS DO SERTÃO.

Tem embrulho de farinha
Para botar na coalhada
E uma panela virada
Na entrada da cozinha.
Quando é de manhazinha
A mulher traz um caixão
Cheio do coco babão
Pra comer com rapadura.
TUDO QUE A GENTE PROCURA
TEM NAS CASAS DO SERTÃO.

Tem casa de caboré
No reboco da parede
Quando um cai numa rede
Faz o maior rapapé.
O povo pensa que é
Um feitiço ou maldição
E roga a Frei Damião
Pra tirar a criatura.
TUDO QUE A GENTE PROCURA
TEM NAS CASAS DO SERTÃO.

Um retrato desbotado
De um candidato a prefeito,
Um moinho com defeito
E um cachimbo apagado.
Uma carta de um cunhado
Chegada do Maranhão,
Esperando um cidadão
Pra decifrar a leitura.
TUDO QUE A GENTE PROCURA
TEM NAS CASAS DO SERTÃO.

Um pote na cantareira,
Cambito no armador,
Chocalho no corredor,
Retrato na cristaleira.
Uma velha roçadeira
Comida da corrosão,
Fivela de cinturão
Com dois dedos de largura.
TUDO QUE A GENTE PROCURA
TEM NAS CASAS DO SERTÃO.

Uma tifanga amarela
Numa porta estendida,
Toda suja e encardida
Que o caçula mijou nela.
Uma velha na janela
Fazendo uma oração
E uma moça no oitão
Procurando uma aventura.
TUDO QUE A GENTE PROCURA
TEM NAS CASAS DO SERTÃO.

Gata parida na cama
Com os filhotes mamando,
O menor fica miando
Porque não alcança a mama.
Os maiores fazem trama
Pra desnutrir o irmão
E depois da confusão
Toma leite com fartura.
TUDO QUE A GENTE PROCURA
TEM NAS CASAS DO SERTÃO.

Fumo de rolo, rapé,
Bico de pua, sovela,
Prato, colher e tigela,
Foice,facão e quicé,
Caco de torrar café,
Cabresto, mão de pilão,
Gato embaixo do fogão
Aproveitando a quentura.
TUDO QUE A GENTE PROCURA
TEM NAS CASAS DO SERTÃO.

Tem na sala de jantar
Uma mesa de umburana,
Que uma vez por semana
O avô vem almoçar.
Tem máquina de costurar
Sendo daquelas de mão.
Mas quando tem precisão
Faz uma boa costura.
TUDO QUE A GENTE PROCURA
TEM NAS CASAS DO SERTÃO.

Onde era o armazém
Temguarda-chuva encostado
Que a tempo não é usado
Porque a chuva não vem.
Desprezado tem também
Os dois tubos de feijão,
A madeira do portão,
Dobradiça e fechadura.
TUDO QUE A GENTE PROCURA
TEM NAS CASAS DO SERTÃO.

Num buraco mora um rato
Com direito adquirido,
mas vem sendo perseguido
Pelo danado do gato.
O rato acha muito chato
Viver na perseguição
Mas o gato faz questão
De manter sua postura.
TUDO QUE A GENTE PROCURA
TEM NAS CASAS DO SERTÃO.

Um velho pai de chiqueiro
Ainda dando o recado
E um carneiro cevado
Cochilando no terreiro.
Uma frango no poleiro
Olhando sem direção,
Sem saber por qual razão
Tem que dormir na altura.
TUDO QUE A GENTE PROCURA
TEM NAS CASAS DO SERTÃO.

Rimei a variedade
Das coisas que o sertão usa,
Sei que ninguém me acusa
De faltar com a verdade.
Se o leitor é da cidade
Pode até não ter noção,
Mas o sertanejo irmão
Sabe que é verdade pura.
TUDO QUE A GENTE PROCURA
TEM NAS CASAS DO SERTÃO.

Mundim do Vale

8 comentários:

  1. Aproveitando esses poucos minutos
    que a net me permitiu eu quero dedicar esse mote para:
    Sávio Pinheiro
    Luís Lisboa
    Dayse Diniz
    e Flor das Bravas.

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  2. Prezado Mundim.

    Pra reuni todos esses terem só nas casas do sertão mesmo.

    Parabens.

    Abraços.

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  3. raimundinho, agradeço de coração
    a bela dedicação de todas essas tranqueiras só não tenho o parente do Maranhão.

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  4. Mundim,

    Você me transportou para as casas do sertão no tempo de minha infância.
    Lembrei bastante a casa de Mundim (Pai da Rebeira), lá na Vazante.
    Grandes versos.
    Parabéns de novo.

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  5. Mundim,

    Só hoje li este saudoso poema. Para quem viveu no sertão, estes versos são dádivas divinas.

    Parabéns e um abraço!

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  6. RAIMUNDIM, aproveitei o dommingo para rever o BLOG, porque há dias, em que a gente, por algum motivo não ler, e depois segue em frente deixando postagens pra trás..
    Deparei-me com essa sua poesia.
    Muito interessante esse resgate de coisas e costumes existentes nas casas do SERTÃO. São objetos preciosos que nos lembram tempos muito BONS...e SAUDOSOS...
    PARABÉNS por tão bem relatá-los.
    Um abração...-

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  7. Reprise melhor postagem de Maio/2011. Veja com atenção, os versos, a mensagem, as lembranças, os terens - tudo muito certinho. Parabens Mundim. Escolha merecida e justa.

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  8. Mundim


    Poeta me permita acrescentar
    As mulheres fiadeiras
    E muita rede de tear
    Cigarro de palha na orelha
    Pro sertanejo fumar
    Café torrado no caco
    No paiol tem rapadura
    Latada e um cacimbão
    Tudo que a gente procura
    Tem nas casas do Sertão.

    A prosa do sertanejo
    Um jegue lento a pastar
    Cheia de pedra a cabaça
    Para limpar e usar
    O pêlo sai com cachaça
    isso eu posso confirmar
    Digo isso com ternura
    E não é mentira não
    Tudo que a gente procura
    Tem nas casas do sertão.

    Mundim do Vale poeta
    Numa casa do Sertão
    Nasci eu ali com festa
    Comi lá feijão com pão
    Também rapa de gamela
    Não perdi a estrutura
    Fechei porta com tramela
    Veja só que confusão
    Tudo que a gente procura
    Tem nas casas do sertão.

    Parabéns Mundim do Vale, pela merecida homenagem. Achei um tema interessante. Se formas falar de tudo que tem nas pequenas casas sertanejas acho que ia faltar espaço.
    Abraço!

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