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"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


quinta-feira, 21 de março de 2013

CAUSOS LÁ DE NÓS - Por Mundim do Vale.

PEIA  REPARTIDA.

Zé de Priscila, nós já citamos ele por aqui no causo do furto do isqueiro. Ele agora aparece novamente nesse outro causo. Zé era afilhado de fogueira do Sr. José Augusto Leite, pai de Alberto. O padrinho considerava Zé como se fosse afilhado de batismo, mas o afilhado além de não ser chegado ao trabalho, era muito malino, gostava de mexer no alheio. Não podia ver isqueiro, chapéu e guarda-chuva distante do dono que surrupiava. Dividia a semana com quatro dias preso e três furtando.
Quando aparecia na mercearia do padrinho gritava da porta:
- A bença. Padim Zé Ogusto !
O padrinho abençoava:
- Deus lhe dê juízo. Mas vá pra casa, que mais tarde eu mando Alberto levar um presente.Mas teve um dia que Zé querendo ampliar o seu ramo de atividade, resolveu furtar a bicicleta de Antônio Diô que estava dentro do mercado. Antônio estava fora do mercado conversando com um soldado e um sargento reformado, que era o delegado de Várzea Alegre.
Quando Zé saiu no portão com a bicicleta na direção norte deu de cara com o dono e a polícia. Antônio Diô gritou e Zé partiu na direção sul. Na agonia da fuga ele não viu que vinha outro soldado na calçada e a bicicleta inventou de atropelar o militar. Quando Zé tentou correr já estava agarrado pelos quatro. Logo que o sargento deu a voz de prisão, Zé Augusto  saiu da mercearia e pediu para que não batessem nele.
A polícia saiu conduzindo o preso pela Av. Getúlio Vargas até o Beco da Liberdade, quando o soldado que foi atropelado notou que a farda estava rasgada, deu um tabefe tão grande no pé do ouvido de Zé que ele já tombou pra cima do outro soldado, o colega não querendo receber  o preso  devolveu com outro tabefe ainda maior.
A sorte de Zé foi o Sargento que falou:
- Já chega. Vocês não viram o cidadão pedir para não bater nele.
Chegando na cadeia o delegado mandou o pessoal sair e deu um bacurejo no preso. E como não encontrou dinheiro falou:
- Ou ladrão sem futuro !
O Senhor José Augusto cortou um pedaço de queijo, pegou uma banda de rapadura e entregou ao seu filho Deda dizendo:
- Vá deixar essa merenda a José e aproveite para dar uns concelhos a ele.
Deda chegou na prisão foi até a cela de Zé e entregou o lanche dizendo:
- Taqui que meu pai mandou pra você, mas ele pediu para eu lhe dar uns concelhos.
- Já sei, os caba já foro dizer a padim Zé Ogusto, mais nem deu certo eu afanar a bicicreta de Ontõe Diô, qui a puliça tava perto.
- Pois é Zé. Meu pai tá preocupado com você, foi não foi você tá preso e isso não é coisa pra homem.
- Num tem pobrema não. Eu já tou acustumado.
- Mas a questão não é só a cadeia, é porque esse sargento trata ladrão é na peia. Você só não apanhou porque meu pai pediu e o sargento atendeu.
- E quem foi qui dixe qui eu num apanhei? Quando nóis vinha ali no Beco da Liberdade, dero dois tabefe no meu peduvido qui meu zuvido inda tá assubiando.
- Pois foi por issso que o meu pai mandou eu lhe aconselhar.
- Apois diga a meu padim Zé Ogusto , que ele arrume oto sargento prumode prender esse daqui, pruque ele é mais ladrão do qui eu.
- Que conversa é essa zé?
- É divera. Onte de noite ele chegou cum um bebo das banda do Riacho do Mei e eu ví quando ele meteu a mão no boço do bebo, tirou o dinheiro e butou no boço dele.
- Mas deve ter sido pra guardar.
- Foi não, pruque hoje de menhã o bebo foi pidi o dinheiro prumode mandar comprar o armoço e ele disse que não pegou  no dinheiro dele não. Aí o bebo disse assim:
- O Sinhor tirou o dinheiro do meu boço.
Aí o sargento disse:
- Você é besta cabra ! Respeite a polícia.
- Mas o Sinhor tirou.
- Você acabe com essa conversa, se não eu mando o meninos lhe açoitar até você aprender a não acusar autoridade.
- E cadê meu dinheiro.
- Se você tinha dinheiro, ou perdeu, ou aquelas raparigas do frejo que tavam sentada no seu colo furtaram.
- Aí quando mãe trouve meu dicumê, foi priciso eu repartir com ele.
Quando Zé acabou de contar a história, o preso do Riacho do Meio que estava na cela vizinha gritou:
- Foi divera Seu Deda.
Deda voltou a alertar Zé:
- Pois é Zé. Eu acho melhor você não ficar comentando o assunto. Porque assim como você repartiu o seu almoço com o colega, pode ser que o sargento queira repartir a peia que ele vai mandar dar ele,  com você também.

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